terça-feira, 16 de junho de 2009

Hipocrisia

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Para quem não conhece o Atheist Eve:


Tradução:

Como se chama um fundamentalista muçulmano que lê o Alcorão? Fiel (ou crente).

Como se chama um fundamentalista cristão que lê a Bíblia? Fiel (ou crente).

Como se chama um fundamentalista cristão que lê o Alcorão? Cético.

Como se chama um fundamentalista muçulmano que lê a Bíblia? Cético.

Como se chama alguém que examina criticamente as crenças dos outros de um modo fundamentalmente diferente das suas próprias? Hipócrita.

4 comentários:

Osame Kinouchi disse...

Olá, respondendo ao comentário do Marco no SEMCIÊNCIA:

Marco,

Eu concordo com você! Nós, como físicos, podemos criticar o abuso da mecanica quantica, principio antropico, etc, nas tentativas de fundamentar algum espiritualismo.

O problema, porém, é ter dois criterios de rigor na analise sociológica da religiao. Criticamos as pessoas por usarem a fisica quantica sem rigor, mas desprezamos o trabalho dos cientistas sociais no estudo do fenomeno religioso e emitimos opiniões de catedra como se nossa autoridade em fisica se estendesse para essas areas nas quais normalmente estamos desinformados (em termos de historia, sociologia, etc).

Lembra a frase do Feynman? Quando um especialista dá uma opiniao sobre algo fora da sua especialidade, sua opiniao nao vale muito mais do que a do zezinho da esquina.

Eu nao estou dizendo que nao podemos dar opiniao sobre religiao ou politica (se fosse assim, a democracia seria impossivel, teriamos apenas uma tecnocracia). Mas o valor de nossas analises será sempre proporcional ao nosso conhecimento sobre o assunto que estamos discutindo.

Por exemplo, eu poderia fazer um artigo de critica sobre o futebol, e o Gremio em particular. Eu já te aviso que o valor desse artigo seria próximo de zero.

Dado que ocorrem muito mais mortes violentas no Brasil devido aos fanáticos das torcidas do que os fanaticos religiosos, eu proponho que o futebol seja eliminado do Brasil para o bem estar e progresso de nossa civilização...

Na questão da religiao, eu sugiro aos meus amigos ler o livrinho "O que é Religião" da coleção Primeiros Passos. OK, eu sei que é sacanagem fazer isso, mas o mais chocante é que muitos deles nem se dão ao luxo de ter um conhecimento nesse nivel. E depois criticamos os religiosos por nao entenderem nada de ciencia. Dois pesos, duas medidas, como naquela charge do Coletivo Acido...

O que eu propus é uma lista de prioridades quando defendemos uma sociedade laica: defender o ensino laico e a universidade laica é mais importante e mais urgente do que eliminar os feriados como o Natal (inclusive porque no post seguinte eu mostrei que o Natal é uma festa do paganismo romano e sua comemoração foi durante muito tempo condenada pelos protestantes e evangelicos puritanos - que são dois tipos bem distintos de pessoas, por sinal). Não vale a pena cair no mesmo tipo de radicalismo puritano.


Finalmente, eu não gosto muito dessas generalizacoes apressadas tipo "A religião é a raiz de todos os males".
Eu mesmo já renunciei à frase "O capitalismo é a raiz de todos os males".

Acho perigoso esse enfrentamento ideologico sem preparo adequado porque a ciencia tem um certo telhado de vidro.
Teodore Roszak, Marcuse, etc diriam que é a ciência e a tecnologia que são a raiz de todos os males, por criarem ferramentas de opressão economica, armamentismo, etc. Então, é bom se preparar bem para defender o nosso telhado de vidro numa guerra cultural ciencia-religião...

Ou seja, eu estou apenas dizendo que se é pra entrar na briga, então é melhor estar bem informado e conhecer o adversário. Qualquer tecnico de futebol faria isto antes de um jogo.

Eu proporia também que nós, como cientistas, evitássemos excesso de retórica e falácias lógicas em nossos argumentos contra a religião, mas não tenho tido muito sucesso nessa proposta. Quando se discute religião, mesmos os cientistas não pensam com o córtex, mas apenas com o sistema limbico...

Jorge Quillfeldt disse...

Caro Osame,

Tendo a concordar em parte contigo, mas ainda não temos (nós todos) muito claro qual a estratégia do ponto de vista educacional a adotar. Certamente divulgar a ciência e esclarecer confusões são algo decisivo, e também é fundamental criticar os excessos dos "oponentes". Porém, como você, eu não acho que valha a pena ir longe demais nessa última linha, pois seria conceder demasiada importância ao próprio ponto de partida da argumentação DELES (o que lhes dá uma certa vantagem que não têm, de fato).

De certo modo, estás preconizando uma forma de NOMA, ou seja, aquilo que o S.J.Gould denominou de "Non-Overlapping Magisteria", conceito com o qual também simpatizo, mas que é imperfeito pois deixa frestas e aberturas perigosas. Frequentemente os defensores de diferentes formas de pensamento obscurantista, seja ele místico ou não, "cruzam" essa fronteira e "invadem" nosso terreno, e na maior parte dos casos somos recrutados para uma "cruzada de estender cercas", i.e., declarar ONDE está a linha divisória dos dois "magistérios". Mas quem conhece um pouco de história e filosofia da ciência sabe que tais "linhas divisórias" são um tema bastante controverso (o tal do "Problema da demarcação"), e podemos cair numa espiral sem fim de pura retórica e pouca substância...

Nossa luta não é fáci. Felizmente, na maioria dos casos que enfrentamos, a linha divisória é fácil de apontar, e funciona bem com apenas mostrar que as afirmações desses oponentes são tão vagas e mal-ajambradas que são meramente hipóteses não-falseáveis (não é preciso ser popperiano ortodoxo para usar esse critério, outrossim, de mero bom-senso lógico).

Saudações,

Jorge

Osame Kinouchi disse...

Jorge,

Concordo com suas colocações e sei que NOMA possui buracos.

Acho que o principal alvo de nossa crítica deveria ser não as religioes em geral, mas sim aquelas variedades que estão afirmando que possuem argumentos científicos para embasar suas crenças: o Criacionismo, o DI, as seitas religiosas Ufológicas, o Espiritismo e a Nova Era tipo "Quem Somos Nós".

Isso do ponto de vista cognitivo. Do ponto de vista politico, é claro que qualquer posição religiosa ou politica pode e deve ser criticada.

Mas ainda prefiro uma posição tipo Viva e Deixe Viver do que a proposta de eliminação de toda variabilidade cultural e religiosa do mundo.

Acho que o desafio maior da Divulgação científica é fazê-la sem cair na ideologia do Cientismo.

http://en.wikipedia.org/wiki/Scientism

Carlos Silva disse...

Achei interessantíssimo o recado do Jeferson Arenzon!
Para mim o recado expõe muito bem a problemática da coisa em si.
Para quem entende que a religião é um substrato seguro para suas ações ou da coletividade a qual o indivíduo acredita pertencer, nada melhor que se enxergar como um crente. Aliás, o mais instigante e característico dessa questão é a palavra de ordem da vez entre os Pentecostais, simpatizantes e congêneres: “Deus é fiel” (1Co 1.9; 10.13; 2Co 1.18). Essa pequena frase justifica plenamente o quadrinho apresentado. Um excelente argumento para acreditarmos em algo que não temos como explicar, mas ao qual atribuímos um poder capaz de nos “salvar” é também acreditar que esse algo (divindade) seja fiel (nos deva obrigação); não traia nossa crença; cumpra o que promete. Caso contrário, passa-se a desconfiar de sua magnitude; fica-se realmente cético a respeito de seu “poder”. Para a grande maioria esses postulados não devem ser testados.
Acho essa uma questão nuclear dentro daquilo para o qual as religiões se prestam, uma vez que são freio ao nosso comportamento caçador-coletor, encurralado há apenas 10.000 anos em um espaço que encolheu mais que 400 vezes. A proximidade extrema nos empurra mais fortemente à escolha de grupos, condutas, etc e, assim, torna a imparcialidade, ou o fomento à dúvida uma escolha perigosa.
Como a educação parece ser uma saída bem mais adequada para deixarmos de agir como caçadores-coletores, que adoram deuses de pedra e fazem sacrifícios das mais variadas formas, porque não conseguimos incorporar à nossa conduta o que a ciência tem nos trazido de melhor? Talvez essa falta de concordância entre o que se prova e como se age, dificulte o entendimento de uma visão socialmente lógica. Esse é um tema árido e, como o Osame colocou, envolve um aprofundamento em entendimentos sociológicos e antropológicos bastante complexos.
Desta maneira, poderíamos propor um complemento ao quadro:
Como se chama um ateísta que lê o mais acessado artigo de revisão propondo uma nova teoria, sem reler cada referência nela incluída? Um crente?
Como se chama um teísta que lê esse mesmo importante artigo, que contradiz o que todos ateístas acreditavam anteriormente? Um cético?
Não se pode entrar em uma contenda de caçadores-coletores, onde Teístas e Ateístas defendem seu quinhão, respectivamente, inventando pontos fracos e argumentos não mensuráveis ou atacando falsas verdades, desmitificadas em ensaios elaborados.
Criamos amarras comportamentais muito fortes nas últimas centenas de milhares de anos para acreditar que a maioria das pessoas deixe de se proteger sem atacar.
Como Osame falou a religião é algo muito complexo para ser apenas olhado através do viés “provado ou não provado”. À medida que o conhecimento é produzido “o véu de Isis vai caindo”, convencendo alguns ou mesmo produzindo transformações nas religiões.
Temas áridos ... temas bons!