A chamada "liberdade acadêmica" (melhor descrita nesta versão) é por vezes invocada para defender qualquer coisa, e, se bem que tais projetos pseudocientíficos dificilmente conseguirão financiamento de agências sérias, nas quais as propostas são avaliadas por pares (uma das reclamações do professor Tronconi, aliás), nada impede que essa subpopulação de colegas "alternativos" cresça e - água mole em pedra dura - comece a aprovar coisas aqui e acolá.
Sobre esse assunto, liberdade acadêmica, vale a pena ler o artigo de Michiel Horn na Canadian Encyclopedia bem como dar uma olhada aqui (tenure), aqui (ateísmo) ou aqui (Declaração dos Direitos Científicos).
Já comentamos o crescente interesse nestes temas em várias Universidades brasileiras, inclusive aqui na UFRGS - a propósito, o magnífico estudo de Widson Porto Reis foi nossa primeira postagem neste blogue, em 12 de maio de 2008, tendo sido literalmente o estímulo que nos levou a criá-lo.
Assim, iniciativas pseudocientíficas ocasionais vão fincando raízes e se perpetuam mediante a (de)formação de estudantes e outros incautos. "Trabalhos" são apresentados em Salões e Congressos como o da SBPC e até mesmo, às vezes, em reuniões de sociedades científicas especializadas. Essa situação alarmante passa despercebida da maioria, e serve-se do manto da autoridade acadêmica conferida por default a acadêmicos que estão em Universidades respeitadas e "doutores" de outras instituições (como se títulos acadêmicos fossem sinônimo de autenticidade ou honestidade).
É um problema complexo, haja visto que o mesmo tipo de argumento vem sendo empregado pelos que defendem que se "ensine a controvérsia", cavando espaço privilegiado para difundir as baboseiras anticientíficas (nem sequer são "pseudo") do criacionismo em suas mais variadas vertentes. Vejam, por exemplo, como o Forum Gospel Brasil, adventista, manipulou uma matéria de capa do NYT usando-a para acomodar seus interesses: "Liberdade Académica sobre a Evolução no New York Times"...
Parece que temos muito trabalho educacional e divulgacional pela frente, e alguns talvez achem que apenas isso não baste... Mas cuidado: falar em "proibição" é tudo que eles esperam para valer-se da confortabilíssima posição de vítimas e, assim, receber parte da aceitação (nem que seja por tolerância) que não conseguem obter por outros meios.
O que vocês acham disso?
Folha de São Paulo - CIÊNCIA - 30/05/2010-10h46
Na UnB, disco voador e astrologia têm status de ciência
Na pequena sala do professor Álvaro Luiz Tronconi, no prédio principal da Universidade de Brasília, misturam-se livros-texto de suas duas especialidades: física da matéria condensada e percepção extrassensorial.
Doutor em física pela Universidade de Oxford, Reino Unido, Tronconi coordena um grupo de uma dezena de docentes que se reúnem para estudar fenômenos que supostamente existem, mas que estão fora do alcance da ciência "tradicional".Fundado em 1989, o Núcleo de Estudos de Fenômenos Paranormais da UnB promove pesquisas e cursos em quatro áreas: astrologia, ufologia, conscienciologia (relacionada aos potenciais do cérebro humano) e terapias integrativas (propondo novas abordagens na medicina).
Um curso de percepção extrassensorial, por exemplo, envolvia "acessar o mundo extrafísico". Um exercício ajudava a "ver assombração, acessar algo do passado, olhar algo do futuro".
"PRECONCEITO"
Tronconi diz que o núcleo já passou por vacas magras e gordas, dependendo do reitor. "Na atual administração o pessoal é menos radical", alegra-se o pesquisador.
Ele reclama de preconceito contra a área. Com frequência os comitês da UnB negam dinheiro para seu grupo. "Mas eles negaram sem julgar o mérito. Sempre falaram que era bobagem, que a UnB não podia permitir aquilo porque ia colocar a universidade em descrédito."
Os órgãos de fomento federais também negam verba, fazendo com que o núcleo procure fundações estrangeiras interessadas na área.
Uma pena, diz. Esses conhecimentos poderiam ser úteis para a sociedade.
"Existe a astrologia médica, por exemplo. Aqui em Brasília você até encontra um ou outro médico que, quando você vai lá fazer o exame, ele pega seus dados e diz qual parte do seu corpo é mais vulnerável, o que pode ajudar no diagnóstico."
Ele diz que sensitivos poderiam também ajudar a polícia. Suas opiniões não deveriam servir como palavra em tribunais, diz, mas eles deveriam fazer parte das equipes de investigações.
"Algumas pessoas dizem que é charlatanismo, que é feitiçaria, que é coisa de quem tem distúrbio mental", diz. Mas, segundo ele, os alunos se interessam profundamente pelo assunto.
Entre as atividades de pesquisa recentes está a busca pela compreensão dos episódios de supostos aparecimentos de extraterrestres na Terra. Uma outra pesquisa tenta mostrar que sensitivos podem dar diagnósticos precisos da doença de alguém.
PERSISTÊNCIA
O último trabalho de Tronconi envolveu levar seis deles para o hospital da UnB para adivinhar o que os pacientes tinham. A conclusão foi que os sensitivos não conseguiam acertar mais do que um computador chutando doenças aleatórias.
Isso não é motivo para desistir das pesquisas, porém, diz Tronconi.
"Quando há um grande médium, um paranormal, a gente vê que ele é capaz de realizar certos fenômenos", diz. "Mas chega uma hora que ele está cansado ou estressado e vai fazer uma demonstração. Então percebe que não vai dar conta e arruma um jeito de fazer usando um truque. Isso pode acabar com toda a reputação dele."
6 comentários:
"Existe a astrologia médica, por exemplo. Aqui em Brasília você até encontra um ou outro médico que, quando você vai lá fazer o exame, ele pega seus dados e diz qual parte do seu corpo é mais vulnerável, o que pode ajudar no diagnóstico."
Maior absurdo que ja li, ouvi ou imaginei em toda minha vida!! Pena da Unb, descrédito é pouco!
Como toda a pseudo-ciência que chega à esfera acadêmica, eles têm pré-conceitos para os quais buscam desesperadamente validação, mesmo ao custo da total distorção dos procedimentos científicos. Nem o mais forte conjunto de evidências os faz rever suas hipóteses, que na verdade já são as conclusões. Igualzinho ao Discovery Institute e tantos outros redutos de lunáticos e cientistas desonestos.
É o preço da Liberdade...
Não vamos muito longe, aqui na UFRGS há o NIETE - Núcleo Interdisciplinar de Estudos Transdisciplinares sobre Espiritualidade.
Exato. Inclusive está mencionado no texto (não deves ter reparado no link para o NIETE):
"Já comentamos o crescente interesse nestes temas em várias Universidades brasileiras, inclusive aqui na UFRGS"
abs,
Liberdade acadêmica deve ser igual à RESPONSABILIDADE acadêmica.
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