quarta-feira, 24 de junho de 2009

Reagindo à expansão da Medicina "alternativa"

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A Medicina não é uma ciência, mas uma tecnologia (ou conjunto de tecnologias) referente ao corpo humano. A maior parte dos avanços incríveis de que somos testemunhas hoje, porém, derivam-se diretamente de avanços científicos e se materializam em equipamentos, técnicas e materiais (inclusive reagentes, anticorpos e outros agentes moleculares). Assim, é de se esperar que picaretas tentem se aproveitar do prestígio da Ciência para "chamar de científico" o que de fato não é também nessa área, tentando cobrir a farsa com o verniz de respeito que só a ciência parece conferir. Cabe, porém, aos atentos alertar para tais descaminhos. Foi o que fizeram o Sindicato Médico do RS (SIMERS), ao publicar apedido mostrado aí em cima nos jornais de Porto Alegre, e também o CREMESP, em nota de seu Conselho de Bioética.

Entre os motivadores desse apedido aqui em Porto Alegre devem estar o "Curso de Medicina Tradicional Chinesa & massagem com técnicas chinesas" e a abertura de inscrições para a ESCAM ("Escola Superior de Ciências Tradicionais e Ambientais"), mas pode ser que não enxerguei algum outro.

Em todo o mundo a Medicina só pode ser exercida por profissionais graduados em escolas reconhecidas, credenciados por um Conselho Federal ou Regional de profissionais e, como se não bastasse, com seu exercício acompanhado de perto por comitês de ética em diferentes níveis. Entre as especialidades médicas mais discutíveis reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina no Brasil, entretanto, encontram-se a acupuntura e a homeopatia, felizmente sob a condição estrita de serem exercidas apenas por médicos diplomados e credenciados (pretendo debatê-los melhor noutro momento). A maioria das demais "especialidades" do mundo da chamada medicina alternativa - "medicina ambiental", "medicina ayurvédica", "terapia holística", iridologia, cromoterapia, florais de Bach, etc - NÃO está contemplada por semelhante reconhecimento (ainda bem!) e não pode ser exercida
por médicos, pelo menos não legalmente. Quem a exerce terá de ser outra coisa... (e, sim, deve também haver médicos picaretas que misturam tudo nessa salada "nova era").

No Brasil, tais arrojos são relativamente recentes, mas já existe até mesmo um "Hospital" nesta linha em Goiás (outras iniciativas pelo país podem ser conhecidas através de um certo "Portal de Medicina Alternativa"). Pelo mundo, porém, inclusive na velha e sábia Europa, esses cursos proliferam como fungos. Chama a atenção que uma busca pelo Google devolve vários vínculos em Portugal, por exemplo, o Instituto de Medicina Tradicional, a Escola Superior de Medicina Tradicional Chinesa e até mesmo um "Curso de Especialização em Medicina Tradicional Chinesa" credenciado (?) e realizado pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto! Teríamos de investigar como tais iniciativas conseguiram ser bem sucedidas em cada caso e pensar em formas de revertê-las antes que mais e mais incautos acabem mal-tratados ou, quiçá pior, defuntos.


PS: Lamento ter priorizado os vínculos ("links") em inglês, mas as versões em português - especialmente dos materiais da wikipedia - são muito incompletas e carecem de boa revisão (algo que deveríamos fazer, aliás).

48 comentários:

Marco Idiart disse...

Interessante não mencionarem medicina espírita.

Ricardo Ferreira disse...

Nada contra ao argumento de vocês e, realmente medicina é uma só, com especialistas formados e graduados para tal.
No entanto, a ciência comete algumas gafes, como de olhar tanto no espelho, se recusa aceitar que entre culturas antigas, técnicas antigas que funcionavam/ funcionam, são simplesmente chamadas de crendices por justamente, não ser científico.
Oras, a ciência ainda não tem todas as respostas, mas nem se quer se dá ao trabalho de esclarecer-se, em algum casos, ficando cega pelo orgulho.
Casos -e agora vão me crucificar-, de pessoas desacreditadas por médicos especialistas formados e graduados, sendo curadas em sessões espíritas.
Psicossomático?
Sequer um especialista dá as caras para estudar o caso, já que o medo de ser taxado como tolo pela comunidade científica, faz preferir chamar de crendices e charlatanismo.
Que há muitos "espertos" querendo enganar, isso há. E sempre haverá. Mas não generalizem, estudem o caso, ao invés de simplesmente julgar para que prevaleça a ciência. Senão, começo a enxergar a ciência como uma religião, algo que abomino.
Claro que deve haver fiscalização e, deveriam retirar todos os que lucram com isso. E o que sobrar, se realmente o tratamento alternativo surtir efeitos positivos, por que não estudar e tentar encontrar, ou conciliar esses métodos?
Ciência é a busca pela verdade, não pelo melhor diploma.
E no caso da medicina, que deveria proporcionar a cura ou alívio, e não a busca pelo melhor remédio químico e caro de uma poderosa empresa farmacêutica. Estudem o caso, ao invés de criticar. Senão, já podem prender bombas pelo corpo e explodir quem for contra vocês!

Luiz Bento disse...

Parece que aqui no Rio a "Medicina alternativa" vai de vento em poupa....

Rede estadual de saúde vai ter programa de terapias naturais
http://g1.globo.com/Noticias/Rio/0,,MUL1197757-5606,00.html

O nosso dinheiro indo pelo ralo.

Marco Idiart disse...

Caro Ricardo

Eu sempre achei estranhas as afirmações do tipo: "a ciência ainda não tem todas as respostas, mas nem sequer se dá ao trabalho de esclarecer-se".
Em todas as áreas possíveis e imaginárias existem cientistas estudando fenômenos. Inclusive porque a sugestão, a fé, os estados psicológicos influenciam a cura.

Mas pelo o que entendo da tua colocação para ti não basta os cientistas estudarem os fenômenos, eles tem que estudar as teorias inventadas que explicam não-cientificamente os fenômenos também. Eu não concordo.

Os espíritos nada mais são que uma explicação pseudo-científica para alguns fenômenos. Como por exemplo: a cura de algumas pessoas, ou a premonição de outras, ou as visões de ainda outras. Os espíritos não são os fenômenos são uma possível explicação.

As críticas que tu lês aqui não são uma negação dos fenômenos, são uma resposta à má interpretação deles.

João disse...

"No entanto, a ciência comete algumas gafes, como de olhar tanto no espelho, se recusa aceitar que entre culturas antigas, técnicas antigas que funcionavam/ funcionam, são simplesmente chamadas de crendices por justamente, não ser científico."

Não, isso não é uma postura cientifica. A ciencia quer saber de tudo e interessa-se por tudo. As suas conclusões é que podem não agradar a todos.

Nos estados unidos apenas ja foram gastos 2,5 mil milhoes de dollares a testar essas coisas tradicionais e até agora o que se descobriu? Que o Gengibre ajuda a nausea...

João disse...

"Teríamos de investigar como tais iniciativas conseguiram ser bem sucedidas"

Oh, man! Vai invadindo, parece que é mas não é, vem devagar, e começa por ser pequeno. Depois Apela para os valores de diversidade e liberdade de opinião, move fortunas e mostra um mundo cor-de-rosa.

Isso e, neste pais onde vivo, professores academicos arrogantes mas incompetentes e ignorantes. Não sao todos, mas são muitos.

Ma divulgação cientifica, pior percepção da ciencia pelo publico - e uma falta de interesse lacinante que leva a ignorancia.

Alguns politicos (para não ser processado legalmente) que querem votos e não compreendem algo simples como "amostra aleatoria significativa controlada em ensaio duplamente cego" - ok a expressão assusta, mas é muito simples o que significa: rigor e objectividade.

Jorge Quillfeldt disse...

Caro Ricardo,

É claro que a a Ciência não tem "todas as respostas", ela simplesmente nunca se propôs a tal coisa: a Ciência se restringe à descrição da realidade material, e é a mais bem sucedida metodologia de compreensão acerca de como funcionam as coisas; e, assim, também base para sua modificação (via tecnologias).

O ser humano tem várias outras dimensões fundamentais para uma vida plena - cultural, social, folclórica, e até mesmo religiosa (ainda que nem todos a tenham) - que simplesmente prescindem desse tipo de embasamento. Não é possível encontrar o significado da existência num espectrograma da luz solar nem a receita da felicidade na transição hiperfina do átomo de hidrogênio. Mas com essas descobertas compreendemos o funcionamento das estrelas sem sequer precisar viajar até elas e agarrar um pedaço na mão para examinar...

Tais maravilhas só são possíveis por que a metodologia científica não mistura as bolas, foca-se no que é possível abordar e FUNCIONA muito bem desta maneira.

Significados e felicidade precisam ser encontrados em outra parte, e que eu saiba a melhor fórmula é a da formação INTEGRAL, contemplando os vários conhecimentos disponíveis.

Não precisa ter medo: a Ciência NÃO é uma religião. Muitos cientistas, sim, o são, mas a Ciência é incólume a isso, por suas próprias características definidoras.

João disse...

"Não é possível encontrar o significado da existência num espectrograma da luz solar nem a receita da felicidade na transição hiperfina do átomo de hidrogênio"

Não, porque são conceitos que dependem de questões pessoais e que são afectgados por convenções. Mas se estivermos a falar da especie humana a coisa ja não é bem assim.

Da nos muita informação para ajudar a tirarmos as nossas conclusões sobre esse assunto. E a psicologia, neurobiologia e cosmologia às vezes fazem descobertas transcendentes (termo correto), que nos levam a repensar o qeu esta e não está ao alcance da ciencia.

Jorge Quillfeldt disse...

"E a psicologia, neurobiologia e cosmologia às vezes fazem descobertas transcendentes (...)"

Não entendi isso que disseste. Quer dizer, eu SOU
neurobiólogo, trabalho com psicobiologia e neurofarmacologia da memória (em animais experimentais), e não consigo imaginar o que venha a ser uma decoberta "transcendente". Posso até imaginar o que venha a ser uma descoberta sensacional ou estupenda (sonho com isso diuturnamente), mas "transcendente"... Por favor, explique.

Ricardo Ferreira disse...

Bom, gostaria de agradecer ao Marco Idiart, João e Jorge Quillfeldt pela atenção dispensada a meu comentário.
Infelizmente não disponho de tempo para tecer outros comentários, pois careço de tempo.
Gostei do ponto de vista de vocês, sobretudo por que são embasados na lógica científica.
Até um outro momento, ou outro artigo.
Abraços a todos.

João disse...

hahaha
Transcender: ultrapassar, ir alem de.

Mais concretamente:

Transcendentes porque transcendem aquilo que o senso comum nos diz ou que não sao intuitivas à primeira vista.

Transcendem as expectativas dos cientistas e a especulação dos filosofos em relação a teorias anteriores.

Transcendem o "é milagre" e alcançam a explicação.

Transcendem o mistério. Porque encontram respostas.

Cada vez é preciso menos milagres e mistérios para explicar e compreender o universo.

E a mente humana, e de alguns animais admito, começa a deixar de ser um mistério a passos largos...

Estava à espera de alguma forma de dualismo? espiritismo? Lamento desaponta-lo.

Se por outro lado é dualista, pode ir fazer companhia ao Deepak Chopra, e largar a sua neurofarmacologia.

E se me pensa acusar de cientismo, não estou nem para ai virado.

:P

Vai negar que a neurobiologia esta a remodelar a psicologia? Tirou o psicologo da caixa preta e foi um espetaculo.

Wander Gomes disse...

Ricardo,

Recomendo vc ler sobre ciência e o método científico. Em particular leia sobre testes clínicos e procure estudos rigorosos que provem que a tal medicina alternativa funciona. Vc vai notar que não há. Depois se pergunte pq vc exige isso da indústria farmaceutica e de outras terapias "convencionais" mas acha normal que as alternativas não sejam. Vai notar que os dois pesos e duas medidas são nada mais nada menos do que uma concessão, uma diminuição dos padrões de exigência para acomodar suas crenças.

A todos,

O CRM não tem moral para falar de medicina alternativa ao aceitar acupuntura e homeopatia. Me desculpe mas não importa se isso está condicionado a ter um médico formado. O que importa é que as técnicas não funcionam. Não passam por testes clínicos. Novamente, pq uma indústria farmacêutica precisa passar por testes clínicos e é responsabilizada criminalmente por reações adversas enquanto que a acupuntura e homeopatia não são? Tolerar homeopatia e acupuntura é uma mancha para a imagem da medicina e profissionais de saúde do Brasil. Eles mais do que ninguém sabem que não funciona e não fazem nada num corporativismo vergonhoso que põe em risco a saúde pública.

João disse...

Então Jorge? Ficaste satisfeito com a explicação?

Para dizer a verdade eu não totalmente. A trancendencia que pensei quando escrevi e decidi manter o termo e a é a dos paradigmas. Acho que é aí que faz sentido usar a palavra.

Faz sentido ou não?

João disse...

Se ficaste aborrecido com o tom de brincadeira eu paro ja com isso. Acho este blogue muito bom,e gostava de continuar a rondar por aqui.

(para além de que não tenho vontade nenhuma de irritar um neurologista) :p

Marcelo do Pagode disse...

E no entanto, funciona... não sempre, mas também não é sempre inútil. Conheço pessoalmente vários casos de cura via homeopatia (por mais "placebo" que possa ser), principalmente de alergias - como rinite, que a medicina "oficial" oferece tratamento mas não a cura. Como também conheço pessoalmente caso de cura via "medicina do espaço" (ver o filme sobre a vida de Bezerra de Menezes), que curou enxaqueca crônica onde a "medicina oficial" não encontrava nem causa nem cura, o mesmo ocorrendo para dor lombar crônica. E o principal: existem pessoas sérias que oferecem este tratamento que não aconselham o abandono da "medicina da terra" (que seria a "medicina oficial"). Inclusive, em geral pode-se distinguir o espírita sério por esta postura, ele não desencoraja a busca pelo tratamento via "médico da terra", pelo contrário incentiva que se busque este tratamento.
Não é só de charlatanismo que vivem estas práticas alternativas, inclusive acredito que elas já teriam deixado de existir se fosse este o caso. Existe o caso do antropólogo que trabalhou com xamanismo e praticou curas de fato...

Não tenho religião, mas tenho minha espiritualidade, não acredito em tudo de nenhuma das que conheci até hoje, mas acredito em várias passagens de muitas delas. Acredito em partes de quase todas, mas não acredito em tudo de nenhuma... Mas como diz o outro: "há muito mais entre o céu e a Terra...".

Como explicar, por exemplo, que uma senhora que não bebe (e não gosta de ver gente bêbada), ao receber a entidade entorna garrafas de champanhe e depois que a entidade sobe ela não apresenta o menor sinal de embriaguês?
Como explicar que a "comida do Santo" arrebenta com qualquer um que comer menos aquele em que o Santo baixou?

Não acho que ciência e religião devam ser excludentes ou concorrentes, até porque se propõem a coisas distintas, o problema é quando um tenta impor limites ao outro (médicos dizendo que não pode haver tratamento alternativo e religioso dizendo que não pode haver tratamento "da terra", por ex.), ou invadir áreas em que sabidamente não se aplicam como usar a física para querer embasar uma religião, por ex. - o que me desgosta profundamente com alguns espíritas, por sinal - ou querer usar a mesma física para "provar" que Deus não existe.
A meu ver, a física não pode ser usada nem para uma coisa nem para outra, afinal como observar o que é presumido inobservável? E dizer que a não observação é prova da não existência todos sabemos que não funciona muito bem.

Mas enfim, mais do que tudo isto que escrevi, o que eu queria mesmo é parabenizá-los por este espaço. Muito bom! Só acho que poderiam cuidar um pouco com a generalização, as coisas não precisam ser 8 ou 80.

Marcelo do Pagode disse...

Aliás, o que tem de médico formado e charlatão.... nem por isso deve-se condenar a medicina.

Marcelo do Pagode disse...

Dois detalhes que esqueci de comentar:

a minha rinite não teve jeito, não curei com homeopatia e larguei de mão o tratamento que fazia quando piá pois ia acabar trocando a minha rinite por problema de coração :P

Aprendi a conviver com ela, paciência. Já soube que hoje existem antialérgicos que não atacam tanto o organismo, quem sabe um dia eu encare....

O outro comentário é sobre um renomado biólogo aposentado aqui da UFRGS que curou sua hérnia de disco com acupuntura, depois de ver fracassadas as tentativas via "medicina oficial".

Mais interessante do que taxar de charlatanismo puro, seria tentar entender porque em alguns casos funciona e em outros não.

Marco Idiart disse...

Caros
Isto me lembra o que o pediatra da minha filha me disse na primeira consulta quando ela tinha apenas 1 mês. Ele disse: "99.9% das vezes que uma criança adoece ela acabaria se curando sozinha, o médico serve para tranquilizar os pais e para cuidar das coisa naquelas 0.1% das vezes que o negócio é sério."
Acho que isto explica muito da existência de tantas terapias alternativas.

E Marcelo, sobre a tal senhora que não bebia etc etc... Isto é o que chamamos um relato. Ou seja é uma informação de segunda mão que não tem como verificarmos. O estranho é que apesar de ser tão difundido na mitologia cultural brasileira, isto nunca foi comprovado em laboratório. Seria tão fácil, não? Um testezinho de bafômetro e pronto. Mas sempre é alguém contando...

Um outro ponto que eu concordo com o Marcelo é que um dos conflitos da medicina é a cura x ciência. Por exemplo se a homeopatia faz os pacientes se sentirem melhores, o médico pode uma tolerância e até recomendar o uso. O problema só vem quando algo que não é comprovadamente eficaz substitui um tratamento tradicional baseado na ciência.

Marcelo do Pagode disse...

Marco,

o relato é de meu parente direto que presenciou, sei que pra quem está lendo é de segunda mão, porém para mim é de primeira, meu parente estava presente e viu, não apenas o trago como a reação com a comida. Assim como ninguém tem motivos para acreditar no relato que ele me deu e que aqui repasso, eu tenho plenos motivos para acreditar. E não é uma questão simplesmente de estar ou não com alto teor alcoólico no sangue, mas sim de que não se nota o menor sinal de embriaguês "a olho nú", diferente do que acontece com qualquer outra pessoa que tenha ingerido igual quantidade de bebida.
E aí voltamos à discussão do bafômetro no trânsito: o que é mais importante, o teste clínico dos reflexos ou o teor alcoólico no sangue?
Embora se saiba que existe uma relação entre eles, não se sabe qual é exatamente esta relação.

Se fosse feito o teste do bafômetro em quem recebeu a entidade, como interpretar os resultados?
Se desse presença alta mas o estado clínico da pessoa é normal, qual seria a conclusão?

Se desse presença baixa, qual seria? Conferir se as garrafas de fato contêm espumante com álcool?

O que acontece de fato eu não sei, mas que algo ocorre me parece inegável. Alguma alteração ocorre com a pessoa, dizer que é a presença de uma entidade ou não é que depende da crença de cada um. Mas algo ocorre.

Marco Idiart disse...

É justamente isto Marcelo. O teu parente contou para ti que contou para mim. É difícil avaliar.
Quando falei do teste do bafômetro, isto não significa que este é o único modo. Pode-se medir tempo de reação, teor alcólico, dilatação de pupilas, etc...

A minha idéia geral sobre estes fenômenos é que são truques muito bem feitos. E tem de ser, pois a sugestão ( nos pacientes ) depende um pouco da credibilidade. Os pacientes tem que acreditar nos fenômenos pare serem curados.

Estudos científicos nos mostram que a percepção de um indivíduo é grandemente influenciada por fatores externos, além do próprio estímulo. Se o contexto é bem desenhado vemos coisas onde não há nada, não vemos coisas onde existem coisas. Por isto que relatos não são muito informativos do que realmente ocorre. Por isto precisamos de instrumentos de medida para esclarecer as coisas.

Dra. Manhattan disse...

Marcelo,

Eu já fui em um terreiro de umbanda, e já presenciei 'possessões', ingestão de bebidas, e etc.
Não há evidência alguma de que tudo não seja teatro, que a garrafa realmente contenha bebida alcoólica (com um teor alcoólico forte) ou que a pessoa que a toma não tenha uma certa resistência ao álcool.

Você diz que seu parente direto te relatou, mas isso não é uma informação de primeira mão, e sim de segunda. Você não presenciou o ritual para ter suas próprias impressões.

A impressão que EU tive ao presenciar foi a de que era uma encenação, ou que a pessoa teve uma sugestão muito forte pra fazer algo do tipo (pessoas que agem como o grupo espera, ou sugestiona, é mais comum do que parece). Coisas semelhantes presenciei ao visitar igrejas neopetencostais, como a Universal do Reino de Deus e também na Igreja Católica, nos cultos da Renovação Carismática Católica.
Os ritos têm suas diferenças, mas é basicamente o seguinte: Começam os louvores, com músicas de ritmo bem definido, até que estejam todos se sentindo parte do grupo. Então começa o sermão. Mas não é um sermão como o de uma missa, é um sermão empolgado e cheio de testemunhos, geralmente acompanhado por uma música baixinha. No auge do sermão, começam as 'curas', 'falar em línguas', 'possessões', 'exorcismos', etc. Aí passa esse momento (aproximadamente uma hora, às vezes mais), e voltam as músicas e os hinos, todos se despedem e vão embora como se houvessem presenciado as coisas mais maravilhosas e tivessem entrado em contato com a própria divindade escolhida.

Note que, para essas coisas acontecerem, é necessário um ritual, é necessário um ambiente e é especialmente necessário que pessoas que acreditem naquilo estejam ao redor.

Jorge Quillfeldt disse...

Caro João,

Não me irritaste, apenas esperavas uma "resposta" numa escala de tempo diferente da minha, que é mais lenta porque, creio, não pertenço a essa geração msn/orkut/twitter, habituada a utilizar a rede para "bate-bolas" rápidos, constantes, intermináveis.

É bom lembrar que nem todos têm tempo para acompanhar esse tipo de dinâmica, por mais que queiram.

Descontando a ironia que empregaste (suponho que te ofendeste com meu pedido de esclarecimento), respondo rapidamente a tuas perguntas:

(1) teu conceito personalizado de "transcendente" deixou a desejar: no texto original cheguei a pensar que estavas a abrir o flanco ao "transcendentalismo"; agora entendo melhor, mas ainda não fiquei muito satisfeito com a explicação dada pois em vez de te ateres ao dicionário, desfiaste uma série de acepções vagamente formuladas - bem, a última até que é inovadora! - e o texto ficou repetitivo e confuso.

Veja, como não nos conhecemos, só disponho de tuas palavras para apreender tuas idéias e concepções (uma pena não existirem poderes paranormais para contornar isso...), daí a importância de se escrever com clareza e concisão para que não surjam mal-entendidos;

(2) não sou neurologista (teria de ser médico para isso), sou graduado em física, professor do Departamento e Biofísica da UFRGS e pesquisador em neurobiologia experimental.

Jorge Quillfeldt disse...

Caros debatedores,

Como imaginei, o debate se desataria sobre Homeopatia e Acupuntura e seria explosivo!

Concordo com algumas colocações feitas aqui e discordo de outras, mas não tenho tempo de entrar em cada uma por separado. Gostaria, porém, que os termos fossem melhor definidos cada vez que empregados para evitar mal-entendidos.

Por exemplo, quando se fala que tais técnicas "funcionam" há que especificar-se melhor o que se quer dizer: "funciona" por que (1) atuou sobre uma patologia real, de forma direta, e a "curou" de fato (o que seria mágico!), ou por que (2) atuou sobre uma patologia imaginária e essas seriam mais fáceis de reverter (algo discutível), ou ainda por que (3) atuou sobre uma patologia real, só que de forma INdireta, mobilizando estados neurohumorais endógenos que favoreceram a cura (que era, desde o princípio - e dadas as condições certas - possível), o que seria um aspecto pouco estudado e até desprezado da biologia humana. A primeira é a explicação mística da homeopatia, já que incompatível com a química, farmacologia e biologia celular atuais; a segunda encontra respaldo na teoria do efeito placebo/nocebo combinado com a psicologia social da sugestão (que não tem nada a ver com "hipnose"); a terceira modifica e aprofunda o tal efeito placebo/nocebo mostrando que ele não é exatamente desprovido de consequências causais materiais, apenas que estas são sutis e se dão fora do "radar" das metodologias diagnósticas hoje disponíveis (nenhum exame de sangue ou tomografia registram claramente pequenas mudanças internas de humor e autoconfiança...).

É fato que existem enfermidades imaginárias e o "tratamento" apenas convence seus pacientes que estas foram removidas (sugestão, efeito placebo), mas há há enfermidades psicossomáticas que podemos reverter simplesmente manipulando - consciente ou (mais comumente) inconscientemente - o estado afetivo em que se está, e é possível haver uma "cura psicossomática", ou seja, situações em que a enfermidade é real mas o conjunto de fatores envolvidos não é totalmente conhecido ou acessível (muito menos controlável) e a manipulação do estado afetivo acaba tendo êxito, permitindo que o corpo "se cure sozinho" (essas situações são mais raras, mas têm um problema sério que é como provar que aconteceram de fato - a força da "sugestão" afeta também os médicos crédulos e tudo fica por isso mesmo...).

No próximo "post" encaminharei um comentário que escrevi sobre essas duas modalidades questionáveis que o CRM aceita, mas nunca havia publicado. Com isso quero ressaltar que o eventual "sucesso" de algumas terapias alternativas pode explicar-se não porque sua pretensa base explicativa esteja correta, mas por que a atenção afetuosa dispensada pelo "terapeuta" mobiliza forças notáveis da própria psiquê daquelas pessoas carentes, solitárias ou desesperadas e promove a "auto-cura", claro, dentro de certos limites restritos: já para casos graves (e até outros menos graves porém mal-tratados) isso não adianta nada, e até pode ser pior, por isso a obrigatoriedade de ser médico é uma salvaguarda significativa.

Fica uma crítica irrespondida à medicina tecnocrática e "fria" de nosso tempos: salvo raras excessões, somos todos "vítimas" desses tempos... façam a lista dos fármacos e drogas (legais ou ilegais) que cada um ingere ao longo de um mês!

Jorge Quillfeldt disse...

(parte 1) Homeopatia e Acupuntura são especialidades pseudocientíficas "favoritas" no contexto tradicional cético, mas é preciso dizer que apesar de reconhecer que ambas carecem de base científica, considero-as especialidades muito diferentes entre si e também das demais "especialidades alternativas": enquanto a ACUPUNTURA é (a) uma técnica terapêutica baseada em conhecimentos acumulados por tentativa e erro ao longo de séculos (e ainda
sem base científica clara
, não custa lembrar), que, porém, (b) funciona
bem
quando restrita ao tratamento de dores, inflamações, distúrbios circulatórios e da ansiedade, e sempre que (c) realizada por um médico de verdade (pois só ele está preparado para optar em tempo por outros procedimentos mais responsáveis
quando for o caso, sem pôr a saúde ou a vida do paciente em risco), a HOMEOPATIA
(a') é uma técnica terapêutica baseada numa teoria que até podia ter alguma sustentação lá por 1796 (quando Samuel Hahnemann formulou seus postulados básicos, muito antes da teoria do átomo e da química moderna), mas que hoje simplesmente não tem base científica nenhuma (a não ser na parte referente ao uso de ervas medicinais, que constitui outra especialidade, a fitoterapia, ainda em vias de reconhecimento, pois esta, sim, poderia estar embasada em estudos da farmacognosia,
uma subdisciplina da área farmacêutica); além disso, a homeopatia (b') não parece funcionar muito bem, e, quando tem algum sucesso, o faz quase sempre devido ao chamado efeito placebo (quando se consegue demonstrá-lo, o que é um problema metodológico grave à parte), e há relatos de seqüelas e até óbitosresultantes da má orientacão dada por "terapeutas" irresponsáveis nessa área.

[continua na próxima postagem]

Jorge Quillfeldt disse...

(parte 2) Eis aqui, portanto, um tema potencialmente explosivo, e, como não poderia deixar de ser, complexo. Assim, apesar de haver consensos políticos e administrativos em muitos países, que reconhecem a legalidade de ambas práticas (como é o caso do Brasil), tanto a acupuntura quanto a homeopatia continuam recebendo críticas demolidoras que considero mais críveis que seus próprios postulados. Dessas, destaco as seguintes:
- Dicionário Cético: Acupuntura
- Dicionário Cético: Homeopatia
- Coleção de Críticas (em português): Homeopatia
- Caso interessante: Homeopatia em julgamento na Itália

A meu ver o que salva um pouco a prática da acupuntura (mas menos a da homeopatia) é algo que está no eixo central da própria "Medicina Tradicional Chinesa", qual seja, um conjunto de técnicas terapêuticas centrado no adequado, respeitoso, afetuoso se possível relacionamento médico-paciente: dá-se uma real atenção ao paciente, escuta-se pacientemente o seu relato e se provê aquele toque de humanidade que cada vez mais faz falta aos médios de hoje, especialmente aos
mais jovens.

Sim, por que uma das consequências pouco analisada da completa mercantilização de tudo em nossa moderna sociedade de consumo é o completo isolamento afetivo e social de cada indivíduo em uma redoma de indiferença: cada vez mais somos "carentes", "solitários", "angustiados" e compensamos isso seguindo as modas sócio-culturais do momento, todas eles promovedoras de estresse crônico (superinformação - especialmente no uso da internet e do celular, narcisismo, velocidade/pressa,
consumismo - incluindo sua vertente hipocondríaca).

A medicina moderna, em que pese todos os fantásticos recursos tecnológicos disponíveis, seguiu essa mesma tendência e perdeu em humanidade (veja esse
artigo
, que alerto ser fraquinho, mas pelo menos é curto) e hoje são pouquíssimos os médicos que têm claro quão importante isso é. Mesmo a educação médica atual é falha neste quesito por causa do predomínio da mentalidade reducionista e da concepção rtecnocrática que crê ser suficiente um mero treinamento esquemático (algo, a meu ver, tão eficiente quanto combater a corrupção e a desonestidade ministrando-se "Cursilhos" de Ética, como se anda a fazer por aí...). O resultado é que boa parte dos pacientes acaba somatizando, isto é, exibindo sintomas físicos sem base fisiológica (senão aquela psicobiológica). Aliás, há anos que se fala que cerca de 40% ou mais dos pacientes que entram em um consultório para reclamar de algum problema tem, na verdade, sintomas psicossomáticos.

O que de fato essas pessoas carecem é de atenção, amizade, carinho, e não exatamente de "tomar remédio". Essas pessoas, aliás, são presa fácil para os picaretas de plantão, incluída aí a avalanche de livros e filmes de autoajuda...

[ fim ]

Marcelo do Pagode disse...

Juliana,

como eu disse, ninguém tem obrigação de crer na informação passada por um parente meu. Porém eu conheço muito bem esta pessoa e no relato dele eu confio plenamente.
Cada um duvida e acredita no que quer. Eu acredito fielmente na informação de meu parente.

Vale lembrar que da mesma forma que existem os que acreditam em tudo, também é verdade que existe os que não creem em nada. Com que certeza se pode dizer que um está certo e o outro errado, quando não temos como afirmar com certeza absoluta a veracidade/falsidade de certas coisas?
Assim como tu tens direito de ACHAR que era uma trama muito em encenada, outros tem o direito de ACHAR que não. Certeza ninguém tem, nem eu, nem tu.

João disse...

Jorge:

O efeito placebo é praticamente só alteração da percepção quer do doente quer do médico ( por isso é quase inexistente em testes triplamente cegos). Sobram as psicossomaticas que se estao a transformar na "psicose das lacunas" ou seja, cada vez vão sendo menos conforme se conhecem melhor as causas - a ultima a cair foi a sindrome da fadiga cronica. Existe tambem sugestão e condicionamento, mas isso tem o valor limitado que se sabe. Pode haver algumas alterações em medições fisicas (hipertensão é um exemplo). Existem artigos que apontam para que o placebo seja pouco mais que artefacto, ao comparar o placebo com não tratamento e não encontrar diferenças.

A Homeopatia estou de acordo consigo que não tem muito por onde se lhe pegue.

Na acunpuntura estou em desacordo. Aquilo não funciona. Com estudos mais recentes, em que a acunpuntura ora é feita fora dos pontos "milenares" ou se usam agulhas falsas para placebo, o resultado é que a "sham" é tão boa como a outra. Agora uma coisa, existe sempre o aparato de preparar o paciente. Daqui vem o efeito placebo. A evidencia acumulada, na melhor das hipoteses, é acerca de dor ligeira ( abaixo do acido actilsalicilico) e nausia. Porque? Porque a dor é sempre por relato do paciente! Aqui é mesmo efeito placebo, que é real mas não um resultado de tratamento. É uma alteração do estado de espirito e de animo que leva a relatar uma sensação diferente mais de acordo com as expectativas. Depois daquele procedimento, o doente relata sempre (quase) alguma melhora.

João disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
João disse...

A evidencia anedotica não serve, mesmo se é concosco proprios.

Não se pode fazer estatistica com um caso, e infelizmente o nosso corpo é uma maquina demasiado complexa para que se possam determinar pares de causa efeito baseados na experincia de uma unica ocorrencia.

Os factores mais importantes a confimar a afirmação anterior, são o facto de cerca de 80% das doenças serem auto-limitantes, e uma boa parte das outras terem ciclos de evolução. (ja para não falar em erros de diagnostico, peculiariedades individuais, etc.)

O reducionismo na medicina não é um problema se não ficarem factores por identificar. A questão é qeu certos aspectos do bem estar humano ultrapassam aquilo que é competencia de um medico.

Peço que ponderem e pensem bem nas minhas ultimas palavras que não sao de modo algum uma apologia da frieza, desrespeito ou falta de preocupação.

Marcelo do Pagode disse...

Só não entendi o porque do "anedótica". Ou melhor, entendi, mas não acho nada apropriada. Sem tivessemos certeza absoluta de que não existe outra possibilidade que não de que o fato seja uma piada, o uso deste termo apenas fortalece o rótulo que muitos nos colocam e que muitos de nós parecemos fazer questão de manter: o de que cientista é o detentor exclusivo da verdade, o que está longe de acontecer.

Assim como "eles" não podem provar a veracidade de suas crenças, "nós" também não podemos provar que é tudo conversa mole pra boi dormir. Podemos refutar certas hipóteses por não acreditarmos nelas (o que muitas vezes também não deixa de ser uma crença, é bom lembrar), temos todo o direito, seja por raciocínio que julguemos lógico, ou qualquer outro motivo. Mas respeitar as crenças alheias é fundamental, principalmente aquelas em que não temos condições de provar em contrário, por mais que julguemos "furadas".

E ainda que fossemos de fato detentores da verdade absoluta, de que adiantaria ser um sábio se apenas rissemos dos ignorantes? Apresentar o caminho correto me parece muito mais útil.

Jeferson Arenzon disse...

Jorge,

O link da wikipedia que citaste como evidência para algumas aplicações bem sucedidas de acupuntura é baseado em um report de 2003 da World Health Organization (WHO), que foi duramente criticado, juntamente com o de 2005 (sobre homeopatia) em:

Beware of Quacks at the WHO
CEES N.M. RENCKENS, TOM SCHOEPEN, and WILLEM BETZ
http://www.csicop.org/si/2005-09/

e que pode ser lido aqui:

jef

João disse...

"Assim como "eles" não podem provar a veracidade de suas crenças, "nós" também não podemos provar que é tudo conversa mole pra boi dormir"

???

Podemos, pelo menos tanto como qualquer outra questão empirica.

João disse...

"Mas respeitar as crenças alheias é fundamental, principalmente aquelas em que não temos condições de provar em contrário, por mais que julguemos "furadas"."

ESpere um pouco... Deixe-me adivinhar... Criacionista?

João disse...

"Apresentar o caminho correto me parece muito mais útil."

Criticar falhas metodologicas não serve de nada é?

Jorge Quillfeldt disse...

Jeferson,

Passei batido por essa referência em particular, mas não me preocupei por que há uma ENORME coleção delas no vínculo do Skeptic Dictionary que enviei. Mas é uma boa matéria. Pena que não posso editar o comentário publicado e acrescentá-la lá mesmo.

Essas análises, contudo, não invalidam a explicação que avancei, a das "vias indiretas", que contemplaria muitos relatos que se percebem como um "sucesso" daquela "terapia". Reconheço, porém, que se trata de uma hipótese ainda por testar.

Por outro lado, acho muito infantil esse comportamento de muitos na comunidade cética de advogar com a teimosia do "não acontece nada - não acontece nada - não acontece nada"... Alguma coisa ESTÁ, sim, acontecendo, e é necessário explicá-la. Eu próprio incorri nessa atitude muitas vezes, e com verdadeiro prazer sádico, admito! Ocorre que isso quase sempre cai muito mal aos interlocutores que queremos atingir, soa como expressão um outro tipo de fundamentalismo - prédica de uns fanáticos. E isso NÃO favorece um diálogo educativo, especialmente com aqueles potenciais "convertidos" mais inteligentes e sensíveis a enfoques arrogantes. Não é um desperdício perdê-los se pensarmos que nossa meta é salvar o máximo de pessoas das garras do misticismo e do auto-engano? (rerere, agora peguei pesado!).

Temos de ter atitude de educadores. Já dispomos da melhor ferramenta racional que existe para a obtenção de conhecimentos acerca da realidade - o método científico. Basta explicá-la pacientemente. Não precisamos tripudiar em cima dos coitados.

(OK, Jef, quem me viu e quem me vê... mas vá lá!)

Marcelo do Pagode disse...

"Mas respeitar as crenças alheias é fundamental, principalmente aquelas em que não temos condições de provar em contrário, por mais que julguemos "furadas"."

ESpere um pouco... Deixe-me adivinhar... Criacionista?


Não estou me referindo a nenhuma em particular, pelo contrário. Incluo aí as diferentes crenças das diferentes religiões/culturas, inclusive as que eu não acredito (como já disse, não tem religião nenhuma pois não acredito em tudo de nenhuma delas), pois mesmo elas eu tenho meus motivos para não acreditar mas não me julgo o detentor da verdade, pelo contrário aceito numa boa que posso estar errado acreditando em credos que podem ser falsos e deixando de acreditar em outros que podem ser verdadeiros. EU não tenho como provar e até hoje não vi nenhuma maneira de fazer isto para TODAS elas. Pois na maioria dos "testes" são quebradas hipóteses fundamentais do credo em questão para se fazer o teste, e aí já foi por água abaixo. Se tu não ACEITAS a hipótese fundamental, o teste lhe servirá, mas se ACEITAS, não. E estas hipóteses, em geral, são questões exclusivamente de crer ou não. Não são questões que podem ser testadas.
Fazendo uma analogia, seriam "axiomas" (postulados) apartir dos quais se constroe uma teoria. Podes provar que certos resultados são (im)possíveis, mas os postulados não se provam, ou se aceitam ou não. Cada conjunto de postulados leva a uma teoria distinta que com base nestes será verdadeira.
Mas pra discutir os "resultados" de tal teoria tem que se utilizar dos axiomas da mesma, não podes utilizar outros.


Em relação aos tratamentos em si, aí eu concordo que pode-se utilizar testes sistemáticos para validar ou não certa técnica, mas em relação aos credos isso não funciona pra tudo. E mesmo nos tratamentos que incluem crença a coisa já vai por água abaixo pois podem tranqüilamente argumentar que "faltou crença". Ora, para quem não acredita isto soa como total absurdo, mas pra quem acredita é esta justamente a base fundamental, e portanto o tal teste não serve de nada para ele pois quebrou um princípio básico (postulado).

Sobre empirismo, como eu disse a não observação de um fato não é prova da não existência do mesmo. Existem partículas que fazem com que diversas teorias quânticas funcionem muito bem e no entanto elas nunca foram detectadas diretamente, podendo inclusive ser mero artifício matemático. Seria correto dizer que elas não existem por não terem sido detectadas? Sem alguém disser que sim, virá logo outro dizer que a teoria funciona com elas, então elas tem de existir!
A base das religiões que possuem entidades (seja Deus com seus mais variados nomes, sejam vários Deuses, sejam Orixás, etc...) partem do princípio que estes possuem vontade própria. Se a pessoa acredita nisto, método científico nenhum vai convencer alguém da não existência, pois sempre poderão argumentar que a tal entidade não tem porque querer provar nada a quem não acredita nela. E o método científico só funcionaria bem nestes casos se abrirmos mão da "vontade própria" destas entidades, mas aí já quebramos uma hipótese fundamental da crença e portanto já não serve pra convencer quem acredita. Pode convencer o cético, mas esse já não acredita mesmo... alimenta quem não acredita mas não afeta o crente.

Ou seja, pra "provar" que tais entidades não existem, teríamos que supor que elas não tem vontade própria, e aí já não funciona pois esta é hipótese fundamental. Quem acredita, acredita, quem não acredita não acredita.

E sim, criticar falhas metodológicas serve sim.

João disse...

Marcelo:

Achei o desenvolvimento que fez das minhas provocações muito interessante.

Mesmo assim, acho que esta a incorrer numa falacia tipo "god-of-the-gaps". Ou seja, que as coisas que ainda não estão provadas e estudadas é onde está a evidencia que vai derrubar o resto da ciencia. É preciso compreender que a plausibilidade dos factos e crenças é um argumento que devia ser superior à fé.

Outra questão, que não sei como se chama mas de certeza que alguem já a descreveu é a seguinte:

Admitir que existe algo que só existe e aparece quando bananas e totos estão a prestar atenção desafia bem a racionalidade.

João disse...

"argumento que devia ser superior à fé"

Esqueci-me de concluir.

Porque se tudo fosse uma questão de Fé, então não seria possivel copnhecer nada. Porque Fé é acreditar porque sim. Se abrirmos a porta a esta explicação temos um buraco maior no sistema que o pior pesadelo Godeliano.

João disse...

Jorge:

Desculpe intrometer-me. Li o Seu ultimo comentário que não me era dirigido mas ainda assim deixe-me responder-lhe.

Eu não tenho preconceitos contra a acupunctura ou Homeopatia. Alias, até à 5 meses atras acreditava que tinha de facto analgesia ligeira por libertação de endorfinas.

Foi uma nova leva de artigos cientificos em que se resolveu o problema do placebo ( e que eu só comecei a ler faz 5 ou 6 meses talvez) que me convenceram do contrario.

A OMS tem essa recomendações porque é politicamente correcto. Tal como a razão que levou o Mao a levantar a proibição sobre acupunctura.

Em minha casa havia um frasquinho com agulhas desde que eu era pequeno e fui ensinado que aquilo funcionava. A minha descrença foi sendo progressiva.

Ainda existe um ponto de acunputura que eu conheço e funciona. Picar com uma agulha a linha media do plano nasal em cães e gatos estimula a respiração (aumenta o ritmo e profundidade). Verifiquei isto pessoalmente dezenas de vezes em varios animais. Mais nenhum ponto atopico existe que tenha sido confirmado. Idem para a dor.

O que acha que significa dizer que picar no sitio certo ou ao lado ou não picar é a mesma coisa?

Um ceptico, não é um tipo casmurro que não quer acreditar em nada que lhe cheiro esquisito. É um tipo que gosta de conhecer o mundo como ele é e que gostava que os outros fossem mais como ele.

Marcelo do Pagode disse...

João,

Não acredito que tudo seja questão de fé, não é isso. O que estou dizendo é que existem pontos fundamentais em praticamente todos os credos em que acreditar neles ou não são puro ato de fé (ou de ausência de fé), como a crença na existência ou não de Deus, por ex.
Eu não acredito na existência de tal entidade, mas não tenho prova nenhuma disto, logo é também uma crença minha que não possui provas a meu favor, apenas minha falta de fé na existência. Eu tenho meus argumentos para não crer, não é que eu não acredite "só pra ser do contra", mas não tenho prova nenhuma de que de fato não existe. Entendes?

Ou seja, que as coisas que ainda não estão provadas e estudadas é onde está a evidencia que vai derrubar o resto da ciencia. É preciso compreender que a plausibilidade dos factos e crenças é um argumento que devia ser superior à fé.

Também não penso assim, não acho que n"as coisas que ainda não foram provadas ou estudas" é que se encontra a evidência do sobrenatural. Apenas alerto que existem pontos que a ciência não consegue chegar a nenhuma conclusão, só isso. Não quero dizer que isto seja significado de algo maior, significa única e exclusivamente que a ciência não conseguiu (ainda) chegar a nenhuma conclusão sobre tais fatos, e que a existência de tais pontos não nos permite dizer que a ciência pode provar que é tudo conversa fiada. Só podemos dizer que é conversa fiada o que a ciência conseguir provar que de fato é balela, o resto não podemos dizer nada com base científica, temos que apelar para outras bases (que podem ou não fazer sentido, mas não são científicas e portanto não podem levar o "aval" da ciência consigo).

Assim como me causa tremendo mal estar cada vez que acompanho alguém a uma casa espírita e escuto falarem que a ciência "prova" a veracidade do espiritismo, me causa tremendo mal estar ver cientistas afirmando que a ciência prova que tudo em dada religião é mentira sem que a ciência tenha verificado todos estes pontos de fato.

Pode-se (e deve-se!) afirmar sobre os pontos em que a ciência chegou a uma conclusão definitiva, mas não se pode extrapolar. Aí já é "achismo", por melhor e mais bem embasado que seja, e portanto não se pode dizer que "a ciência" provou sem que ela tenha provado de fato.

Espero que tenha sido mais claro agora.

Marco Idiart disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Marco Idiart disse...

Caros, este debate está muito legal. Mas não estaria sendo injusto se afirmasse que de fato todos os debatedores pensam muito parecido e estão simplesmente exercitando a eloquência e o intelecto.

A questão de respeitar credos é obviamente questionável. Se alguém me provar que manter uma dada fantasia sobre o universo (mesmo que falsa) é melhor para a humanidade do que a própria verdade, talvez eu aceitasse e nunca mais falasse no assunto. Como esta prova é muito difícil eu decido caso a caso, ou seja indivíduo a indivíduo.

As discussões aqui são mais de princípio. Acho que não devemos cair na tentação de dizer que o que não é provado tem que ser aceito. Ou que o cientista deve provar a não-existência de Deus ou se calar. Obviamente sabemos que o ônus da prova está com quem propõe o fenômeno ou a explicação dele, senão passaríamos o resto da eternidade desprovando o papai noel.

A posição de cientístas como nós aqui do blog ( pois existem cientistas de todos os tipos, inclusive aqueles que conseguem conviver com o mundo mágico e o mundo científico, sem prejudicar sua atuação neste último ) consiste mais no que poderíamos chamar de uma "educated guess" sobre o funcionamento do universo e sobre o poder explicativo de teorias religiosas ou pseudo-científicas. Mesmo que a afirmação de que todo o ganso é preto, não possa ser induzida logicamente de termos visto somente gansos pretos até agora, ela é a inferência mais racional que podemos ter sobre gansos e cores, e portanto a mais útil.

João disse...

Marcelo,

É isto:

"Obviamente sabemos que o ônus da prova está com quem propõe o fenômeno ou a explicação dele, senão passaríamos o resto da eternidade desprovando o papai noel."

copiei do Marco Idiart.

Afirmações extradordinarias requerem evidencias extraordinarias. Se não ha tens de usar o que se saber para avaliar a plausibilidade.

Falacia do argumento pela ignorancia.

Patola disse...

Marcelo do Pagode:

Acho que houve uma falta de entendimento sobre um termo usado aqui, que julgo que seja um falso cognato do inglês pra português. "Anecdote" no inglês significa não uma piada, mas relato apenas (geralmente sem formas de comprovação, que é o que nos interessa aqui). No português temos a palavra "Anedota" que é parecida mas evoca obrigatoriamente o humor.

Então, quando o João disse que "a evidência anedótica não serve", quis dizer na verdade que "a evidência relatada sem comprovação não serve". Me parece que você ficou irritado porque imaginou que ele estivesse caçoando de ti.

Marcelo do Pagode disse...

Patola,

de minha parte tens toda razão, a interpretação que eu dei foi exatamente a do português.

Jeferson Arenzon disse...

Creio que em espanhol também tem este significado, como no inglês. Como o João é de Portugal, não terá lá também este sentido? Aliás, sempre me pareceu que o "Anedotário da Rua da Praia" fosse isso, uma coleção de causos, não necessariamente engraçados.

cristal disse...

Engraçado como tanta gente acredita que esta forma de consciência que mal se conhece a si mesma, tem acesso à VERDADE toda sobre o universo de que somos uma parte irrisória... seja por qual método for. Acho forte pretensão... Vamos descobrindo parcelas de coisas, integradas em sistemas de crenças, mais ou menos discutíveis mas sempre limitadas a uma dada perspectiva e a um dado contexto... o resto é fantasia mais ou menos consciente, mas pura fantasia... seja chamada de religião ou chamemos-lhe ciência, A integração de níveis, o conhecimento de relações, o abarcarda complexidade... Acho que devemos olhar bem para o nosso tamanho, tanto em estatura quanto em tempo e, sem desistir de compreender mostrar, contudo, alguma noção de entendimento de como somos pequenos perante a gigantesca empresa a que nos propomos. Pelo menos isso. Acho que, a partir daí, talvez deixemos de nos preocupar tanto com o poder que temos ou não de influenciar os outros, de ter a verdade ou de ter razão, ou de saber quem a tem... Talvez as discussões possam passar para outros assuntos como a distribuição equitativa dos recursos, o respeito pelo planeta de que somos parte e não donos e outras coisas que, até aqui, só por acaso se encontram...

Jorge Quillfeldt disse...

Prezado(a) Cristal anônimo(a):

Além de cientista, sou militante ativo em questões sociais e ambientais, e opero, sim, minhas opiniões nestas temáticas, só que nos foros cabíveis. NESTE fórum a temática é Ciência e Pensamento Crítico, e aqui dedicamo-nos a apontar onde há interpretações equivocadas e/ou simplesmente erradas (o que se denomina vulgarmente de "pseudociências").

Assumimos nossa obrigação de cientistas-educadores e arregaçamos as mangas para apontar o que é e o que não é ciência: acreditamos que saber distingüir entre estas áreas não só é útil a qualquer cidadão, mas é sobretudo fundamental na definição de futuras carreiras para os jovens que buscam respostas a suas inquietações acerca do mundo.

Eventualmente assuntos da grandeza que sugeres passaram ou passarão por aqui também. Como, porém, detecto um certo "relativismo gnoseológico" em tuas palavras (perdoe-me se estou errado), permito-me alguns esclarecimentos:

(1) Falando em Ciência estamos a falar de um MÉTODO de analisar dados da realidade, que levanta fatos e produz explicações ou teorias que, por sua vez, são formuladas de modo a serem testáveis experimentalmente (ou devassáveis logicamente), e, a seguir, submetidas ao contraste - sempre sob a eterna vigilância dos pares de nossa imensa e crítica comunidade científica: ao cabo, nossas hipóteses ou acabam mostrando-se falsas, ou verdadeiras. Estas são as únicas "verdades" com que a ciência lida, e são sempre verdades provisórias e temporárias, em constante mutação: a meta da ciência é, portanto, aproximar-se cada vez mais da realidade, mas nunca "fechar" qualquer explicação definitiva, por que isso é cognitivamente impossível (quem faz isso são as religiões, os cultos e as pseudociências, instâncias que, por vezes, se confundem - mas que nenhuma É Ciência).

Sendo assim, diante do edifício do saber científico, todo cientista é antes de mais nada um indivíduo humilde capaz de admitir que está errado, quando está errado, e de dizer que não sabe, quando não sabe (claro que há excessões, como há maus elementos em todas as profissões).

(2) Somos, a bem dizer, "neuróticos profissionais", acostumados a conviver com incertezas e constantes dúvidas.
Somos, certamente "pequenos", como dizes, e com conhecimento (factual) de causa. Fazer Ciência, portanto, não é para qualquer um, mas isso não nos torna "especiais" ou "superiores" de nenhuma forma, apenas nos faz "diferentes", tão diferentes das demais profissões quanto somos de um bombeiro treinado para lidar com labaredas ou um piloto de aeronave treinado para voar.

(3) Isto é ciência, certamente muito mais frugal e menos charmosa do que geralmente se pinta. Porém, daquelas "verdades" científicas, provisórias e temporárias como são, derivam-se muitas tecnologias como a que estás a utilizar aqui para manifestar tua opinião (e admitamos que é uma tecnologia emancipatória, pois permite a realização eficiente de um direito fundamental de qualquer ser humano). Essa tecnologia FUNCIONA porque seus fundamentos (científicos, não se esqueça) são, em alguma medida, "verdadeiros" - senão não funcionaria. Computadores, fibras ópticas, satélites e programas não são bruxaria nem foram produzidos no além ou em outra dimensão: são fruto dessa prosaica, porém notável atividade crítica humana. Aquilo que Albert Einstein chamou um dia de "a coisa mais preciosa que temos", a Ciência.

Assim, o relativismo não se sustenta: nem toda forma de "saber" produz o mesmo resultado. Pode ter outra função e valor, mas não são iguais nem equivalentes.

Bem vindo à realidade como ela é. Aqui ninguém é dono da verdade e cada um pode concluir isso por contra própria. Em nenhuma outra área do saber é permitido tal grau de rebeldia e iconoclastia.

Cogita tute!